terça-feira, 6 de junho de 2017

O que perdemos pelo caminho

Não sei bem como começar este post, mas tenho de falar sobre isto. Na passada sexta um antigo amigo do colégio contactou-me via facebook. E foi uma agradável surpresa durante para aí uns 3 minutos, até que percebi que o motivo pelo qual ele me contactava era para me informar que uma amiga nossa do secundário morreu. 

Já não falava com a M. há mais de 10 anos, trocava breves comentários no face, ou no dia de anos dela mandava um beijinho e assim ficávamos. A vida afasta-nos das pessoas, é inevitável. Acho que nem eu nem ela lamentámos muito isso, acontece simplesmente. Mas o afastamento nunca determinou que ela não tivesse sido importante para mim. 

Nunca fomos as melhores amigas mas tinhamos um bom entendimento, nos tempos do colégio juntávamos com frequência um grupinho e íamos a casa dela com frequência, seja para passar a tarde, para estudar, para nos arranjarmos para alguma festa, a cadela dela, o ser mais doce que me lembro, era como se fosse nossa também (pesou-me muito quando morreu), saíamos muitas vezes à noite, os meus primeiros fins-de-semana fora foram com ela, foi ela que me apresentou ao Friends, e ainda hoje, quando vejo episódios desta série, lembro-me dela. 
Nem sempre era fácil conviver com a M., ela precisava por vezes de atenção que ninguém compreendia, era sensível e tempestuosa, conseguia ser incrivelmente competitiva com as outras raparigas, mas comigo nunca o foi. Sempre senti que tínhamos uma amizade bastante simples e limpa. Talvez os sinais tenham estado sempre lá, e se calhar todos devíamos ter sabido mais cedo que ela não estava bem aqui. Porque a M. decidiu morrer. 
Ontem foi o velório. Não pude ir porque estava refém do centro de saúde, mas também não sei se conseguiria enfrentar vê-la sem vida. Talvez ela esteja finalmente em paz, talvez aquela inquietação tenha finalmente ido embora quando ela decidiu terminar tudo. 

E quanto a mim, penso nela incessantemente há 4 dias, sem saber muito bem como lidar com a estranheza disto tudo. Prefiro lembrar-me dela como aquela miúda meio rebelde, que foi a primeira a fazer um piercing e tatuagens ainda durante o secundário, que trabalhou num bar e nos dava bebidas à borla, que me acompanhava nas noites de karaoke quando eu (achava que) sabia cantar e me apoiava incondicionalmente, que nos abriu sempre as portas de casa dela e nos deixava sempre à vontade, e que no concerto dos Limp Bizkit (ih pois foi, fomos ver esse!) foi chamada para os conhecer ao backstage apenas por ser uma miúda gira. Foram tão bons tempos, sinto-me tão grata por tê-los vivido com ela. Quero lembrar-me do sorriso e do entusiasmo dela, de como a tornavam mais bonita. Quero acreditar que ela viveu antes de morrer.  Quero não me esquecer.

O ano passado e este ano têm sido anos de perdas duras. O meu mundo vai mudar e vem aí uma pessoa nova em folha (entre tantas que vão nascer ou já nasceram este ano). Faz parte, as gerações renovam-se. Fico com tanta pena de ver tantos a perderem-se pelo caminho, de não poder viver tudo isto com elas por cá. Parece que crescer é isto, mas gostava mesmo que abrandasse o ritmo durante uns tempos. Anda a ser duro demais.

4 comentários:

Maria disse...

Soube apenas ontem e mesmo em "cima da hora".
Fiquei sem palavras e nem queria acreditar.
Concordo com tudo aquilo que disseste e nunca pensei que fosse terminar assim.
Aparentava ser feliz..
Desde que soube que não páro de pensar nela e daquilo que vivi com ela. E na mãe dela, a prof. E.
Um beijinho gigante para ti.

Analog Girl disse...

Nem consegui comunicar com mais ninguém quando soube na sexta, passei o fim de semana sem acreditar muito nisso e ontem a coisa pesou com mais força que nunca. Havia uma parte de mim que não queria acreditar. Ontem não consegui escapar...

Agridoce disse...

Nunca é fácil lidar com a partida de alguém... Sobretudo, num caso destes, em que alguém tão novo, desistiu de viver. Por mais voltas que dês, é inevitável o sentimento de "o que é que eu podia ter feito?": Mas, em sendo racional, também sabes que não há nada que pudesses ter feito.

É lamentável que ela tenha chegado a esse ponto, que não tenha pedido ajuda, que tivesse chegado a esse desespero em que a vida parece deixar de ter solução.

Faz-nos pensar. Faz-nos pensar em nós, na nossa vida, nos que temos à nossa volta.

E é uma grandessíssima merda.

Mas, infelizmente, é a vida. E a vida também é a morte.

Neste momento, foca-te na vida que estás a gerar, foca-te no que podes fazer pelos teus, por ti.

Um abraço e um beijinho!

Analog Girl disse...

Agridoce, faço minhas as tuas palavras. Não há nada que uma pessoa possa fazer, ainda menos agora. E sim, devo focar-me no que é bom e procurar o melhor em cada dia. O percurso dela acabou, ela assim o decidiu. Com muita pena minha, mas cada um tem o seu caminho. E a vida continua...